Necrológio – Prof. Celso Antonio de Carvalho

dr.celso
A oftalmologia brasileira, perde um pouco do seu brilho com o falecimento do Prof. Celso Antonio de Carvalho, ocorrido dia 4 de novembro último. Poucas semanas antes de completar 87 anos de idade, trabalhando em seu consultório, começou a ter os primeiros sintomas de uma hemorragia cerebral que se instalava em decorrência de uma queda ocorrida no mesmo dia pela manhã em sua residência, à qual inicialmente não deu a devida importância. Neste dia teve que interromper seu expediente regular de trabalho e de estudo, como fazia diariamente em sua clinica , para poder ser encaminhado ao Hospital Sírio-Libanês, onde veio a falecer após alguns dias. Dessa forma, cumpriu o que sempre quis ou seja, manter-se em atividade até o fim de sua existência.Natural de São Paulo , graduou-se em medicina na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo ( FMUSP) no ano de 1953. Em 1954 ingressou na residência médica do Hospital das Clinicas (HC) da FMUSP, tendo desempenhado, durante 2 anos, atividades desenvolvidas na 1ª Clinica médica e na Clinica oftalmológica do HC-FMUSP.

De 1955 a 1958 , através de bolsa de estudo da W.K. Kellogg Foundations, desenvolveu seus estudos nos Estados Unidos, desempenhando suas atividades no Departamento de Oftalmologia da Harvard Medical School, em Boston , no The Johns Hopkins Hospital (Wilmer Ophthalmological Institute) em Baltimore, Maryland e em Stanford Medical School em São Francisco, Califórnia. Quando de sua volta ao Brasil, procurou aprimorar seus conhecimentos em glaucoma, desempenhando atividades conjuntas com o Prof. Archimede Busacca

Em 1959 tornou-se médico contratado do HC-FMUSP para desenvolver funções junto à clinica oftalmológica, e em 1960 defendeu tese de doutoramento em oftalmologia na FMUSP. Em 1961 foi nomeado médico-assistente da clinica oftalmológica da FMUSP e em 1964 defendeu tese de docência livre, tendo sido aprovado com distinção. Através de concurso, se tornou Professor- Adjunto e logo em seguida Professor-Associado da FMUSP. Dirigiu o Serviço de Neuro-oftalmologia da clinica oftalmológica, e em 1966 criou a Clinica de Glaucoma do HC-FMUSP, tendo ocupado o cargo de diretor do Serviço de Glaucoma até sua aposentadoria em 1998. Foi coordenador do curso de Pós-graduação de oftalmologia da FMUSP, e do curso de pós-graduação em oftalmologia “latu sensu”, do Centro de Estudos Universitários do Instituto Internacional de Ciências Sociais. Foi membro de várias instituições médicas do Brasil e do exterior, mais particularmente aquelas ligadas ao glaucoma,

Foi um dos líderes da oftalmologia brasileira , tendo se dedicado intensamente ao glaucoma, o que o levou a ser considerado juntamente com o Prof. Nassim Calixto, com quem desenvolveu importantes trabalhos científicos, o precursor do desenvolvimento do estudo do glaucoma em nosso pais, e consequentemente uma referência entre os maiores especialistas no Brasil e no exterior.

Sua vida acadêmica foi bastante produtiva, publicando grande número de trabalhos científicos particularmente sobre glaucoma, em revistas nacionais e estrangeiras. Foi orientador de grande número de pós-graduandos do curso de pós-graduação da FMUSP e foi incansável no sentido de estimular e promover o desenvolvimento de novos especialistas em glaucoma

Dr. Celso, assim eu o chamava, foi uma pessoa fora do comum. Tive o privilégio de usufruir do seu convívio, quase que diário, por um período de 29 anos, tempo este em que praticamos nossas atividades profissionais e de estudo em conjunto, no mesmo local de trabalho sendo que, em parte desse tempo, Dr. John Helal Jr. compartilhou conosco o mesmo ambiente de trabalho no desempenho de suas atividades profissionais. Ao mesmo tempo que atuávamos em nossa atividade regular de consultório, procuramos também desenvolver estudos científicos em conjunto, a maioria relacionados ao glaucoma, utilizando dados clínicos obtidos em nosso ambiente de trabalho. Dessa forma foram desenvolvidos, somente em nossa clinica, dezessete (17) trabalhos científicos que foram publicados no Brasil e no exterior. Foi um longo período de contatos frequentes, tanto relativos à vida profissional como também relativos às atividades acadêmicas e até mesmo familiar. Assim, minha convivência com o Dr. Celso foi extremamente gratificante. Sua maneira de se conduzir do ponto de vista acadêmico e de ética profissional, bem como seu caráter humanitário, foram exemplos valiosos de como deve ser desempenhada a verdadeira medicina.

Dr. Celso sempre mostrou preocupação em se manter atualizado na aquisição de novos recursos semiológicos usados na prática oftalmológica. Assim, foi um dos pioneiros no emprego e no estudo da ultrassonografia ocular em nosso país. Sistematicamente promovia reuniões de médicos residentes e assistentes do HC em sua residência , com o objetivo de traçar planos de trabalho e novos projetos de estudos. Foi incansável no estímulo aos mais jovens e nunca revelou qualquer sinal de interesse próprio nesse sentido.

Católico fervoroso, Dr. Celso sempre se conduziu rigorosamente segundo os preceitos religiosos, procurando sempre ajudar o próximo, e em particular aqueles mais próximos do seu convívio. Em relação à família, nunca deixou de demonstrar que considerava ser a base de tudo. Viveu intensamente a vida acadêmica e considerava a Faculdade de Medicina da USP a sua segunda casa. Foi um verdadeiro professor na acepção da palavra . Pelo que representou, e pela maneira como sempre se conduziu, merece ser lembrado como um exemplo de vida.

Alberto Jorge Betinjane

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